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  • Foto do escritorJorge Humberto Dias

O que podem os Gestores aprender com os Filósofos?


Num primeiro impulso, a resposta é: Sem dúvida que podem aprender muito!

E esta resposta está absolutamente certa.


Francis Bacon, Filósofo da época moderna, conhecido como “fundador da ciência moderna”, defendia que a Filosofia devia ser utilizada como uma ferramenta. Este posicionamento é um excelente ponto de partida para se analisar alguns dos inúmeros contributos que a Filosofia disponibiliza para crescermos enquanto Gestores e enquanto líderes de uma organização.

A presente reflexão pretende centrar-se em quatro grandes questões, que, estando intrinsecamente conectadas, representam as principais preocupações de um Gestor e os seus principais desafios na tomada de decisão:


· Mudança

· Pensamento

· Criatividade

· Felicidade


Mudança


Luc de Branbandere, Filósofo belga dos tempos atuais, na sua obra “A metade esquecida da mudança”, recorre a diversos Filósofos da história, como: Heráclito, Sócrates e Bacon, para explicar que mudar é mudar duas vezes: a realidade está constantemente a mudar, mas é necessário mudar também a perceção. A perceção é designada pelo autor como o lado oculto da mudança. Um Gestor lida com a realidade todos os dias, mas tem que ter em conta também a perceção. Branbandere exemplifica com a questão da pontualidade: alguém que chega sistematicamente atrasado, não vai mudar de comportamento apenas com a ação. É necessário mudar a perceção do comportamento. Alterando o horário, vai chegar a horas apenas uma ou duas vezes. Alterando a forma como compreende a pontualidade, o ganho que poderá ter, como por exemplo, não perder informação importante, ou ter tempo para um café, ou sentir-se menos ansioso, pode levar a mudanças mais duradouras. Este simples exemplo pode ser transposto para a generalidade das mudanças. É preciso perceção para que as coisas aconteçam. Muitas ideias de negócio inovadoras não vingam no mercado, porque o consumidor não tem a perceção da mudança. Para existirem mudanças reais é necessário mudar a perceção.

E como se trabalha a perceção? Através do pensamento, ou seja, a forma como pensamos.

O que nos leva a uma segunda questão, que é uma das mais básicas preocupações da filosofia: compreender a forma como pensamos. Alguns exemplos: A forma como vemos o mundo, o que é que nos condiciona a visão, como tomamos decisões em função dessa visão, de que forma estamos conectados com o mundo.


Pensamento


Para nos ajudar a pensar na forma como pensamos, vamos recorrer a uma imagem que nos dá Luc de Branbandere. Quando um pai ou uma mãe diz a alguém que está a pensar no filho, isso é verdade. Quando um Gestor diz a um jornalista que está a pensar nos seus clientes, isso não é verdade. O gestor tem inúmeros clientes, é impossível pensar neles todos ao mesmo tempo. O que quer isto dizer? A Filosofia apresenta-nos a resposta pelo nome de modelos mentais. Perante tanta informação, para a processar e entender, o Homem cria simplificações. Modelos mentais são assim simplificações do mundo. O Homem organiza o mundo que vê em categorias, clusters, caixas, cenários, segmentações… Existem muitas palavras para descrever as simplificações que fazemos.

A Filosofia descreve o modo de pensar em dois movimentos distintos: a dedução e a indução.

Quando pensamos ou nos movemos de nós mesmos para o mundo ou nos movemos do mundo para nós.

É chamado o movimento de dedução quando nos movemos de nós para o mundo. Deduzir é uma forma de pensamento. O ponto de partida é uma hipótese, um conceito, uma afirmação, um julgamento, uma simplificação.

É chamado o movimento de indução quando nos movemos do mundo para nós. É uma outra maneira de pensar, mais difícil. É quando construímos hipóteses, conceitos, teorias, paradigmas, etc.

Em resumo, pensar é essencialmente usar e produzir modelos mentais. Simplificar.

A dedução é uma forma de pensar que apresenta poucos riscos, pois é feita com base em modelos mentais que já existem, é baseada na lógica. Por outro lado, pensar de forma indutiva pressupõe criar novos modelos com base em infinitas possibilidades. Um exemplo é a utilização de analogias. E é aqui que surge o pensamento criativo, através da combinação de coisas que não estavam conectadas antes. Lavoisier é um exemplo de criatividade. Utilizando os seus conhecimentos de contabilidade fez enormes progressos na química, com base em analogias. Descartes é outro exemplo. Combinou a geometria com a álgebra.


Criatividade


Como podemos então estimular o pensamento criativo?

Kant, Filósofo alemão da época moderna, disse que nós não vemos o mundo como ele é, nós vemos o mundo como nós somos. E a partir deste pensamento filosófico surge a ciência da psicologia com novas abordagens para nos entendermos melhor a nós e aos outros.

O pensamento criativo consiste basicamente em fazer conexões de diferentes áreas, relacionadas ou não, mostrando-nos que a abertura ao mundo, a tudo o que nos rodeia, é imprescindível para a obtenção de novas soluções. A criatividade surge muitas vezes quando aceitamos ter outra visão, outro olhar, outra perspetiva sobre o mesmo problema. Se entendermos como o cérebro funciona, podemos ser mais criativos. Identificando o modelo mental que estamos a utilizar para perceber o mundo, vemos que, para mudarmos, temos que utilizar um modelo mental diferente, caso contrário, estaremos sempre a pensar da mesma maneira e não saímos do mesmo lugar. No mundo corporativo, isso pode significar o fim de uma empresa.


Felicidade


A felicidade é o fim e o princípio. A felicidade é o caminho. Palavras sábias de Mahatma Ghandi, advogado indiano da época moderna. Não encontramos uma definição inequívoca do que é a felicidade. Nem na Filosofia, que é uma ciência que privilegia os conceitos. É simples perceber isto. É que a felicidade é essencialmente algo intrínseco a cada ser humano.

A felicidade no mundo corporativo não é algo generalizado, não é algo que por norma faça parte da cultura da maior parte das empresas, contudo, temos assistido já a alguns passos nesse sentido, com o aparecimento, por exemplo, de novas profissões como o happiness officer e também o corporate philosopher. E de que forma um Filósofo pode ajudar um Gestor numa corporação? Um Filósofo essencialmente ajuda na formulação de perguntas. Muitas vezes, mais do que uma resposta, é necessário uma boa pergunta. E é essa experiência que um Gestor necessita, pois grande parte dos dilemas têm inerentes dimensões filosóficas.

A preocupação pela busca da felicidade vem desde Aristóteles.

Perceber o que faz cada um feliz, criar ambientes de trabalho saudáveis, estimular o propósito de vida é um trabalho para todos, de todos. É um trabalho individual e coletivo. É um trabalho onde os Filósofos têm um papel preponderante e para o qual os Gestores cada vez mais se consciencializam do seu poder.


Coimbra, 06 de abril de 2021.


Marta Bento (MBA em Gestão de Felicidade e do Capital Emocional nas Organizações e Investigadora colaboradora do Projeto "Perspetivas sobre a Felicidade. Contributos para Portugal no WHR (ONU)")

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